O Infante mudou tudo isso, mas a mística ficou agarrada
àquelas pedras de forma indelével. Em todo o lado sente-se o peso da história,
nas muralhas, nas velhas caraças dos canhões gastas pelos anos e pelo salitre,
nas paredes do velho templo, na misteriosa rosa dos ventos, nas furnas que
descem até ao mar pelo ventre da terra.
Mas nada do que se vê de terra é mais esmagador que a vista
a partir do mar! A primeira vez que admirei esta paisagem a partir do reino de
Neptuno, foi a bordo do paquete Funchal. Ainda hoje, passados 35 anos, revejo
esse momento com uma claridade cristalina. Estávamos a jantar, pelas janelas
comecei a ver desfilar a praia da Bordeira, depois o Castelejo, não esperei
mais, saí para o convés e debrucei-me na amurada. Ouvia-se Wagner, os penhascos
erguiam-se altivos, deslumbrantes à luz do pôr do sol, o navio aproximou-se
tanto como as regras de segurança permitiam, deixando os mais pequenos
pormenores ficarem expostos aos meus olhos.
Aos poucos fomos contornando o cabo de São Vicente e
dirigindo-nos para Sagres, Wagner continuava a tocar pelas colunas do navio,
olhei à minha volta, estava só contemplando a mais bela paisagem que jamais
vira.
Perguntei-me se voltaria a ver Sagres do mar… e aquele rosto
lindo de morrer. Voltei para Lagos procurei-a, não mais a vi.
16 anos depois voltei a cruzar aquelas águas, desta vez no
meu pequeno veleiro, voltei a procurar aquele rosto fugidio no meio da
multidão. Sagres vista do mar voltou a mostrar-se em todo o seu esplendor num
mar estanhado, lá em cima pareceu-me vê-la! Toquei a sirene, abanei freneticamente
os braços... Não. Não era ela, tenho agora a certeza.
Redijo estas linhas a seu lado, contemplo o seu rosto sereno
e belo. A noite vai adiantada, não tarda estarei abraçado a ela no nosso leito,
sonhando com uma viagem a seu lado contemplado aquela paisagem divina uma vez
mais.
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