ESTOU NO MAR, NO AZUL INFINITO, ESTOU MOLHADO, SENTINDO O SABOR DO SAL, O CHEIRO DA MARESIA. VEJO A LUA REFLECTIDA NO MAR, INUNDANDO-O DE UM BRILHO PRATEADO.
SEJAM BEM-VINDOS AO LADO ESCURO DA LUA.
Há lugares no mundo que deixam uma marca profunda na nossa
alma, Sagres sempre me fascinou, foram inúmeras as vezes que a visitei por
terra, só ou acompanhado, o promontório e o cabo "onde termina o
mundo", este sempre foi um local quase místico. Aliás para os povos da
antiguidade era mesmo um lugar místico. Os Celtas chamaram-lhe o promontório
dos Deuses. Outros povos achavam que era ali que o mundo terminava, era ali que
começava o mar das trevas.
O Infante mudou tudo isso, mas a mística ficou agarrada
àquelas pedras de forma indelével. Em todo o lado sente-se o peso da história,
nas muralhas, nas velhas caraças dos canhões gastas pelos anos e pelo salitre,
nas paredes do velho templo, na misteriosa rosa dos ventos, nas furnas que
descem até ao mar pelo ventre da terra.
Mais a oeste vislumbra-se o cabo de S. Vicente com o seu
farol, o ponto mais a sudoeste da Europa, a ponta do velho Continente que
aponta para o Novo Mundo, entre ambos uma enseada com vários recantos e um
charmoso Castelo hoje transformado numa unidade turística.
Mas nada do que se vê de terra é mais esmagador que a vista
a partir do mar! A primeira vez que admirei esta paisagem a partir do reino de
Neptuno, foi a bordo do paquete Funchal. Ainda hoje, passados 35 anos, revejo
esse momento com uma claridade cristalina. Estávamos a jantar, pelas janelas
comecei a ver desfilar a praia da Bordeira, depois o Castelejo, não esperei
mais, saí para o convés e debrucei-me na amurada. Ouvia-se Wagner, os penhascos
erguiam-se altivos, deslumbrantes à luz do pôr do sol, o navio aproximou-se
tanto como as regras de segurança permitiam, deixando os mais pequenos
pormenores ficarem expostos aos meus olhos.
Aos poucos fomos contornando o cabo de São Vicente e
dirigindo-nos para Sagres, Wagner continuava a tocar pelas colunas do navio,
olhei à minha volta, estava só contemplando a mais bela paisagem que jamais
vira.
Dias antes tinha visto um rosto que também havia marcado a
minha alma, tinha aparecido e depois perdera-se na multidão que preenche as
ruas nas noites estivais de Lagos. Receei não mais voltar a rever tão marcantes
imagens. Fiquei por ali, a noite caiu fiquei apreciando as luzes do Algarve:
Burgau, Luz, Lagos, Alvor, Portimão…
Perguntei-me se voltaria a ver Sagres do mar… e aquele rosto
lindo de morrer. Voltei para Lagos procurei-a, não mais a vi.
16 anos depois voltei a cruzar aquelas águas, desta vez no
meu pequeno veleiro, voltei a procurar aquele rosto fugidio no meio da
multidão. Sagres vista do mar voltou a mostrar-se em todo o seu esplendor num
mar estanhado, lá em cima pareceu-me vê-la! Toquei a sirene, abanei freneticamente
os braços... Não. Não era ela, tenho agora a certeza.
Passaram outros 16 anos, olhando para um quadro de fotos em
casa de alguém que conhecera há poucos dias, volto a rever aquele rosto
fugidio! Aquela cujo rosto para sempre ficou gravado na minha alma como as
imagens daqueles rochedos imponentes.
Redijo estas linhas a seu lado, contemplo o seu rosto sereno
e belo. A noite vai adiantada, não tarda estarei abraçado a ela no nosso leito,
sonhando com uma viagem a seu lado contemplado aquela paisagem divina uma vez
mais.
Músicas: Regatta de Blanc – The Police; Mysterious Ways - U2
Imponente, a Catedral de Palma de Maiorca, domina as vistas.
A altura das suas torres, as mais altas de Espanha, desafiam o facto de
estarmos numa ilha.
Por todo o lado há alguém a tentar vender algo, quadros,
malas, sapatos, recuerdos… também há artistas de rua, que fazem pinturas,
performances, homens/mulheres estátuas e o estranho casal que levita numa
armação bem disfarçada. Houve-se uma viola tocando o concerto de Aranjuez, o
sol é abrasador, apesar dos jactos de água que caem no lago que fica no sopé da
catedral o calor torna-se pesado enquanto o sol procura a sua posição mais
alta, como que para ver melhor todo o esplendor que se estende por baixo.
Uma brisa levanta-se, embala as folhas das palmeiras que
alegres fazem coro aos acordes da viola do virtuoso artista de rua que a
dedilha alegremente.
Ao virar de uma esquina os
olhos preparam-se para abraçar o mar, quando uma figura enigmática rompe a
paisagem chamando a si as atenções.
Agarrando a larga borda azul do
chapéu que o vento tenta em vão retirar para descobrir o seu rosto sereno,
deixando o alvo vestido ondular ao sabor deste, ora mostrando ora ocultando as
suas formas perfeitas. Pequenas rendas orlam as extermidades das curtas mangas,
como se brancos lírios lhe ornamentassem os braços firmes e maduros.
Olha fixamente para o Mar,
não se deixando distrair com as mundanas figuras que cruzam a rua. Por momentos o tempo pára, tudo fica estático,
congelado. Apenas ela continua a mover-se naquela forma misteriosa, ondulando
como o vento, provocando um pesado suspiro de paixão.
O roxo das Buganvílias contrasta com o verde e o amarelo
dominantes, traçando um friso colorido no topo do muro desta casa com singelas
varandas e venezianas verdes.
As palmeiras omnipresentes compõem a moldura muito acima das
luminárias que quase passam despercebidas. Ali numa muito camuflada esquina uma
cascata de belas flores azuis vai descendo pela trepadeira que cobre por
completo o muro que delimita a propriedade e dá suporte ao socalco que aplainou
o espaço onde esta moradia se ergue.
O calor continua opressor, pesado e húmido, convidando a uma
paragem para refrescar.
Que melhor local para fugir à canícula que a Plaça de la
Feixina, com os seus lagos e cascatas, sempre com a água correndo, mergulhando
aqui e ali debaixo das pedras do passeio, para surgir uns metros à frente mais
fresca.
As amplas sombras do arvoredo auxiliam no arrefecimento,
enquanto acenam para a água embaladas pela aragem que atravessa a ilha de norte
para sul.
Convidando a uma paragem para descansar as pernas e
arrefecer os músculos enquanto se contempla o escoar do tempo na sombra do
relógio de sol, ali instalado numa das faces de pirâmide de pedra, noutra surge
um enigmático relógio de lua, com a sua tabela de legenda e descodificação.
Os muros do castelo opõem-se à linha das palmeiras deixando
no seu regaço um largo passeio de pedra.
Ali surge novamente a bela silhueta alva, agora dança,
alegre, feliz, deslumbrante. Rodopia de braços abertos abraçando o vento numa
valsa ensurdecedora de silencio. Baila com o calor e com as gotas de humidade
que pairam pelo ar arrastadas desde as cascadas pela suave brisa estival.
Continua misteriosa a forma como se move, como dança, como
caminha. A harmonia instala-se, todo o quadro ganha uma formosura singular, até
a catedral estica as suas torres por entre as palmeiras para observar este
pitoresco panorama em movimento, esta poesia silenciosa e serena.
Abraço a beleza do quadro e regresso ao navio, sou um
marinheiro, um homem do mar, apaixonado pela doce silhueta alva que misteriosamente
se movimentava, ora caminhando, ora dançando.
Contemplo a linha do casario que se estende entre as verdes
colinas e o azul do mar, a multitude de embarcações que descansam na grande
marina, os paquetes luxuosos que preparam a partida para o alto mar.
Tudo parece pacífico, sereno, nem o vento se sente agora.
Sinto uns braços a me envolver, um doce perfume invade-me as
narinas e o doce som de uma voz faz-me estremecer.
Lentamente viro-me, perante mim está a delicada figura alva com
que me cruzei uma e outra vez durante o dia.
A noite caiu, não sentimos o sol esgueirar-se sob as ondas
distantes, inebriados pelo tão inesperado como anunciado encontro. Os nossos
olhares não se desviaram durante as longas horas em que o glorioso astro
atravessou os céus.