quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

10.000 anos depois entre Vénus e Marte


Rebuscando no baú, venho a verificar que cometi um verdadeiro pecado. Ainda não me referi a este magnífico álbum, como sou um pouco presunçoso, chamo-lhe o melhor que já foi feito em Portugal.

Pouca gente imagina José Cid a tocar Rock Progressivo, a "atacar" os sintetizadores como poucos, ouvir nas suas músicas longos solos de viola eléctrica, letras de ficção cientifica e vê-lo associado a Mike Sergent não tão é improvável como com Ramon Galarza e Zé Nabo. No entanto em 1978 editou um disco com todos estes ingredientes - 10.000 Anos Depois Entre Vénus e Marte.

José Cid, um dos músicos com a carreira mais extensa em Portugal, aparece normalmente ligado à música popular, sendo este álbum um exemplar, e que exemplar, único. A revista americana Billboard coloca-o nos 100 melhores álbuns de sempre do género. Aliás este disco passou algo despercebido em Portugal, enquanto além fronteiras obteve um sucesso e um reconhecimento ímpares na nossa música até mesmo nos dias de hoje.

Antecessor da explosão do Rock Português, foi contemporâneo dos Tantra, uma banda de Rock Progressivo portuguesa apenas conhecida por franjas minoritárias de jovens desalinhados com o main stream; um e outro acabariam por eclipsar-se na espuma de Xico Fininho e de Cavalos de Corrida.

10.000 Anos Depois Entre Vénus e Marte é uma Ópera Rock que conta uma história de ficção cientifica: o planeta Terra está em colapso, moribundo, levado à destruição pelos Homens, o ar fica irrespirável e o Sol invisível entre a bruma da poluição. É o caos, a humanidade morre, as cidades tornam-se em valas comuns. A esperança desapareceu, o futuro morre na apatia dos homens. No meio deste caos um casal foge para o espaço, percorrem uma longa viagem entre planetas maravilhosos e 10.000 anos depois regressam à Terra para começar do zero.

Se recuarmos a 1978 o tema poluição não estava entre as prioridades da humanidade, hoje na esteira da conferência de Paris sobre o ambiente e das alterações climáticas, esta história não poderia ser mais actual. Até neste ponto 10.000 Anos é inovador e desconcertante, como é que um músico que cantava "A Rosa que te Dei" vem-nos contar uma história tão futurista e mostrar-nos uma visão de um holocausto, com um suporte musical arrojado?

Uma última palavra para o grafismo do disco, também ele inovador, naif q.b. e que transformava a capa do disco num livro cujo texto era, nem mais nem menos, as letras das músicas.



Fiquem bem no lado escuro da lua.

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Lagos

Não nasci aqui. O meu berço foi 15 Km a este, em Portimão; os meus pais "imigraram" tinha eu 1 ano. Mas hoje quando me perguntam "De onde és?" - a minha resposta é: "De Lagos."

Esta é de facto uma cidade muito especial, talvez uma das mais belas do mundo, para mim certamente a mais bela das cidades.

 O rendilhado da costa, as dezenas de pequenas praias, a majestosa meia-praia com os seus 8,5 Km de areia branca e suave, o casario baixo do centro da cidade, as ruas que serpenteiam pelas colinas acima e abaixo.

Lagos tem uma poesia única e inigualável, seja na canícula do Verão ou na chuva de Inverno.
Não é apenas a visão que é seduzida por este paraíso na Terra, o uivo do vento que sopra quase ininterruptamente, entrecortado pelo cantar das gaivotas, com o som das ondas quebrando-se na areia; o cheiro a maresia que invade cada cm2 da cidade; o sabor do sal que se deposita nos nossos lábios e a caricia do vento no rosto e cabelos, preenchem na totalidade os 5 sentidos.
 Desde o nascer ao pôr do Sol, mas também sob a Lua e as estrelas, a luz reflecte-se no mar brincando com as ondas, criando jogos com as sombras, mudando sem cessar a paisagem, fazendo com que cada momento seja único e irrepetível.

O Sol, a Lua, as estrelas e, também, as luzes da cidade, tudo contribui para a atmosfera quase mítica que se vive. 
Por fim há a história, a história dos homens que começou no paleolítico, prosseguiu pelos Celtas, Iberos, Romanos, Visigodos, Árabes, Cristãos...

Atingindo o píncaro no berço dos Descobrimentos, quando uma pequena nação teve a impertinencia de aumentar o mundo, empurrando os limites do fim do mundo para as estrelas.

Hoje tudo isto jaz violado, delapidado por algumas piranhas que sem pudor empurram o Infante para o lado, destroem a calçada que reproduzia as ondas do cabo Bojador, que aterram a mais bela praia do mundo...

Para esses vendilhões do templo, traficantes de cimento, nem mil mortes seriam castigo suficiente.

Mas a poesia continua lá, pedindo Show me the place...

Não há um caminho para a felicidade, a felicidade é o caminho.



Fiquem bem no lado escuro da Lua.